Museu História Natural, NY. |
A aula de História da Arte prosseguiu no museu.
_Esta tela pintada por um famoso artista
renascentista, é a mesma coisa daquela.
A turma olhava, chegava mais perto do
quadro, observava um, observava o outro fazendo as comparações, mas não
descobria semelhança alguma.
_ Estou referindo à composição do
figurativo; ao valor das cores; à incidência da luz e da sombra. Vejam esse
outro. Observem atentamente. Não se trata de um quadro e sim de dois iguais, pintados
na mesma tela. O pintor poderia ter dado o trabalho como acabado ao atingir a
metade. A mensagem já estaria passada por completo.
O pessoal olhou o castelo ali retratado com
perfeição. Não conseguia enxergar o que o mestre ressaltava:
_ Como há simetria no aspecto arquitetônico
da residência, quebrou-se a surpresa. Nada ficou para a leitura imaginativa. É
algo monótono de se ver. Desinteressante... - ao passo que aquele quadro lá,
continuou a explanação, não é um quadro. São três em um.
Novamente a turma olhou para onde a caneta
laser do professor apontava sem descobrir do que ele falava agora. Sabiam ser
aquela pintura bonita e agradável aos olhos, e mais nada.
_ Prestem atenção: são três motivos
independentes que não se integram. Além disso, as muitas tonalidades utilizadas
pelo artista fazem desta obra uma obra inquieta. Nervosa. Tem semelhança com
aquela outra. Ambas fazem nosso olhar passear de lá pra cá, não de maneira
instigante, e sim, irritante.
Os alunos se entreolharam.
O professor, entusiasmado com as raridades
ali expostas, deixava de lado o acompanhamento dos pupilos desta vez para
comentar uma tela abstrata, do tamanho de uma mesa de refeições para oito
pessoas:
_ Vamos sentar para melhor apreciar. Sintam
a emoção na força das pinceladas do artista. Olhem a suavidade empregada em
alguns espaços a gerar uma ilusão de movimento, transição, mutação enfim.
Respirem a espiritualidade que emana dos contrastes ao fundo. Harmonizem-se com
os sentimentos do autor a se inspirar em seu estado d’alma, exprimindo todo o
júbilo de existir e se comunicar de maneira universalizada. Estão sentindo a
diferença? É só quando se abstrai do concreto que se consegue transcender ao
infinito..
Passados trinta minutos, todos ali
sentados, em frente ao mais famoso entre os famosos exemplares do
abstracionismo de todos os tempos, o mestre sugere enfim:
_ Se alguém quiser comentar, esteja com a
palavra.
Silêncio.
_ Fiquem à vontade.
Silêncio.
_Consegui decifrar professor. Favor
emprestar-me a caneta laser para que eu possa fazer as indicações para os caros
colegas seguirem.
Caneta laser na mão deu inicio ao que achou
por bem externar.
_ Aqui está um grupo de nuvens. Acima um
touro vindo disparado. Olhem suas patas. Pela altura em que está, pode ser
referência à constelação zodiacal...
Antes que prosseguisse, interrompido pelo
vozeirão do professor, ouviu sua condenação:
_ NÃO ENTENDESTE NADA! Abstrato é abstrato.
Não se faz necessário enxergar e identificar figuras na obra. Ela fala por si!
E o aluno:
_ Arte não precisa ser entendida ainda mais
com uma única maneira de interpretá-la. Cada qual elege o que gosta, de acordo
com seu modo de ser. Tentar entender o abstrato é uma coisa, querer fazer o
outro interpretar o que sente e lhe é transmitido no momento necessitaria o
“colocar-se dentro da alma da pessoa”. É tudo muito pessoal e único. Para mim,
o que aí está lembra o firmamento e estrelas. Gosto muito por causa do mistério
que o universo traz para o meu mundo.
_ Ham...faz sentido.
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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora (não de Português) resolveu escrever. Colabora com o jornalzinho da família, participa de concurso cultural e coleciona seus textos para publicar oportunamente. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia".
EXCELENTE TEXTO! Com profundas implicações filosóficas e de um didatismo exemplar. Gostei muito mesmo. Pode contar um pouco mais sobre a elaboração e criação da ideia?
ResponderExcluirDidaticamente, é um exemplo do que um professor não deve ser, mas como a maioria ainda é, uma pena! A verdadeira educação é aquela que ensina a pensar e ver o mundo com os próprios olhos, sujeito cognitivo que abstrai dos fatos suas próprias interpretação subjetivas, pessoais, únicas.
Muito obrigada Edison. Conforme expliquei anteriormente, meus textos nascem de um fato, uma conversa real ou de uma observação do meu cotidiano. Depois de uma breve reflexão escrevo de manei-ra a levar pessoas a embrenharem por outros caminhos, enxergando a complexidade do pensamento humano, aceitando o outro. Isto para mim, aplica-se principalmente à arte. E a arte pode estar em muitas de nossas ações.
ExcluirQuanto aos professor que não enxerga o aluno agente de seu próprio aprendi-zado deve ser porque não aprendeu assim.
Vasculhas os seus escritos e mande mais textos assim.
ExcluirAbraços,
por enqto. estou fora do meu domicílio. Logo que eu retorne das férias acatarei sua sugestão. Obrigada.
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