julho 13, 2013

A mesma coisa

Museu História Natural, NY.

A aula de História da Arte prosseguiu no museu.

_Esta tela pintada por um famoso artista renascentista, é a mesma coisa daquela.

A turma olhava, chegava mais perto do quadro, observava um, observava o outro fazendo as comparações, mas não descobria semelhança alguma.

_ Estou referindo à composição do figurativo; ao valor das cores; à incidência da luz e da sombra. Vejam esse outro. Observem atentamente. Não se trata de um quadro e sim de dois iguais, pintados na mesma tela. O pintor poderia ter dado o trabalho como acabado ao atingir a metade. A mensagem já estaria passada por completo.

O pessoal olhou o castelo ali retratado com perfeição. Não conseguia enxergar o que o mestre ressaltava:

_ Como há simetria no aspecto arquitetônico da residência, quebrou-se a surpresa. Nada ficou para a leitura imaginativa. É algo monótono de se ver. Desinteressante... - ao passo que aquele quadro lá, continuou a explanação, não é um quadro. São três em um.

Novamente a turma olhou para onde a caneta laser do professor apontava sem descobrir do que ele falava agora. Sabiam ser aquela pintura bonita e agradável aos olhos, e mais nada.

_ Prestem atenção: são três motivos independentes que não se integram. Além disso, as muitas tonalidades utilizadas pelo artista fazem desta obra uma obra inquieta. Nervosa. Tem semelhança com aquela outra. Ambas fazem nosso olhar passear de lá pra cá, não de maneira instigante, e sim, irritante.

Os alunos se entreolharam.

O professor, entusiasmado com as raridades ali expostas, deixava de lado o acompanhamento dos pupilos desta vez para comentar uma tela abstrata, do tamanho de uma mesa de refeições para oito pessoas:

_ Vamos sentar para melhor apreciar. Sintam a emoção na força das pinceladas do artista. Olhem a suavidade empregada em alguns espaços a gerar uma ilusão de movimento, transição, mutação enfim. Respirem a espiritualidade que emana dos contrastes ao fundo. Harmonizem-se com os sentimentos do autor a se inspirar em seu estado d’alma, exprimindo todo o júbilo de existir e se comunicar de maneira universalizada. Estão sentindo a diferença? É só quando se abstrai do concreto que se consegue transcender ao infinito..

Passados trinta minutos, todos ali sentados, em frente ao mais famoso entre os famosos exemplares do abstracionismo de todos os tempos, o mestre sugere enfim:

_ Se alguém quiser comentar, esteja com a palavra.

Silêncio.

_ Fiquem à vontade.

Silêncio.

_Consegui decifrar professor. Favor emprestar-me a caneta laser para que eu possa fazer as indicações para os caros colegas seguirem.

Caneta laser na mão deu inicio ao que achou por bem externar.

_ Aqui está um grupo de nuvens. Acima um touro vindo disparado. Olhem suas patas. Pela altura em que está, pode ser referência à constelação zodiacal...

Antes que prosseguisse, interrompido pelo vozeirão do professor, ouviu sua condenação:

_ NÃO ENTENDESTE NADA! Abstrato é abstrato. Não se faz necessário enxergar e identificar figuras na obra. Ela fala por si!

E o aluno:

_ Arte não precisa ser entendida ainda mais com uma única maneira de interpretá-la. Cada qual elege o que gosta, de acordo com seu modo de ser. Tentar entender o abstrato é uma coisa, querer fazer o outro interpretar o que sente e lhe é transmitido no momento necessitaria o “colocar-se dentro da alma da pessoa”. É tudo muito pessoal e único. Para mim, o que aí está lembra o firmamento e estrelas. Gosto muito por causa do mistério que o universo traz para o meu mundo.

_ Ham...faz sentido.

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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora (não de Português) resolveu escrever. Colabora com o jornalzinho da família, participa de concurso cultural e coleciona seus textos para publicar oportunamente. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia".

4 comentários:

  1. EXCELENTE TEXTO! Com profundas implicações filosóficas e de um didatismo exemplar. Gostei muito mesmo. Pode contar um pouco mais sobre a elaboração e criação da ideia?
    Didaticamente, é um exemplo do que um professor não deve ser, mas como a maioria ainda é, uma pena! A verdadeira educação é aquela que ensina a pensar e ver o mundo com os próprios olhos, sujeito cognitivo que abstrai dos fatos suas próprias interpretação subjetivas, pessoais, únicas.

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    1. Muito obrigada Edison. Conforme expliquei anteriormente, meus textos nascem de um fato, uma conversa real ou de uma observação do meu cotidiano. Depois de uma breve reflexão escrevo de manei-ra a levar pessoas a embrenharem por outros caminhos, enxergando a complexidade do pensamento humano, aceitando o outro. Isto para mim, aplica-se principalmente à arte. E a arte pode estar em muitas de nossas ações.
      Quanto aos professor que não enxerga o aluno agente de seu próprio aprendi-zado deve ser porque não aprendeu assim.

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    2. Vasculhas os seus escritos e mande mais textos assim.
      Abraços,

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    3. por enqto. estou fora do meu domicílio. Logo que eu retorne das férias acatarei sua sugestão. Obrigada.

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