dezembro 25, 2020

Passagem de Ano

Por Elisabeth Santos

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A noite mais comprida do calendário anual acontece do dia trinta e um de dezembro ao dia primeiro de janeiro, pois vara a madrugada com muitos fogos de artifício colorindo o céu sem acordar os anjos. Sim, usamos beleza sem barulhão. Até que enfim deram um jeito de diminuir os decibéis que atormentavam seres vivos do nosso planeta.

Muitos sons e ruídos vamos ouvir nesta noite festiva: estouros de champagnes, músicas, cantorias, risos, e até algum beijinho estalado.

E as comemorações da virada do ano velho para o ano novo continuam. Seja com carnaval e samba; Folia de Reis e desfiles folclóricos; Rezas e orações; amigos e famílias reunidas; bebidas e comilança até o dia amanhecer... Cada qual como desejar, ou puder comemorar a entrada do ano que começa.

Hora de repensar, analisar, fazer médias. Momento de planejamentos, de resoluções e tomadas de atitude. O que queremos realmente? Afinal o que muda mesmo, se o sol irá nascer e morrer a cada dia?

Ano novo pode ser encarado de uma forma boa para todos e cada um: conservar com carinho tudo que foi bom; refazer o que precisar ser refeito; tentar atitudes novas, que estavam encruadas... enfim serão muitas as possibilidades, porém nem todas dependem só de nós. Assim mesmo vamos ser corajosos e não desistir facilmente do que nos faz bem.

De nada vai adiantar almejarmos um ganho extraordinário de dinheiro caído das nuvens. Não que seja impossível. Dependerá de muita sorte. Lembremo-nos então que seriam muitas sortes ao mesmo tempo: estar no local, no momento, com malas, força e disposição. Bem comparando seria... buscar uma estrela qualquer num céu de brigadeiro, e na noite seguinte acha-la no mesmo lugar em um segundo!





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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora (não de Português) resolveu escrever. Colabora com o jornalzinho da família, participa de concurso cultural e coleciona seus textos para publicar oportunamente. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia".

dezembro 18, 2020

Vendo

Por Elisabeth Santos

Azaleias

Vendo o meu quintal!

Você aí que está a ler esse anúncio, preste bem atenção: o preço é módico para que o pagamento seja a vista. A vista é linda de cada um dos quatro lados que você olhe estando no centro do retângulo equilátero. De duas laterais você poderá ver campos, morros, algumas ruas, e casas o suficiente. Da terceira lateral, percebe-se a existência dos quintais vizinhos. E na quarta erguendo o olhar, você pretenso comprador, verá a varanda dos fundos da casa onde resido há vinte anos. No jardim de entrada existe passagem da rua para o quintal.

 Sendo um terreno em declive, e não sendo temporada de estiagem, a enxurrada desce sem empecilho e por um vão deixado no muro para isto, se espalha no pasto de cavalos de sela, e bois de puxar carro. Todos bons de serviço, não perdem tempo com namoricos!

  O quintal em questão, motivo do anúncio, tem a seguinte medida que eu mesma conferi: setenta por trinta e cinco passadas largas. Tem as seguintes árvores: meu limoeiro e meu pé de jacarandá versejados e cantados; encantado pé de uvaias; muitas cactáceas de belas flores, e saborosas pitayas; e duas preciosas nogueiras a produzir pecans.

 Aqui não falta: banana, goiaba, abacate e laranja. Cada qual em sua época, tem-se frutas o ano todo. Com elas vem: saís e sanhaços de cores variadas; as patriotas maritacas vestidas de verde, e uma seleção de canários amarelos. Sabiá laranjeira, o senhor João de barro, rolinhas e pardais formam a corte de sua majestade o sabiá. Gente, a melodia do sabiá, se junta ao chamado do bem-te-vi, ao trinado de tantos outros pássaros, que parece mesmo uma orquestra. Revezam-se do nascer ao pôr do sol trazendo alegria a todos.

Na hora da refeição reforçadora da passarada tem disputa perto do cocho de alpiste. Observo que os maiorzinhos ameaçam os pequenos. Não lhes dão sossego até que chegue outro que os enfrente.

 Quando o gato sem dono passeia em cima do muro, sabendo muito bem o que quer é o momento certo de todos baterem asas em fuga, numa revoada só.

Tucanos vem visitar-me para bicar e derrubar abacates ou comer a parte verde das nozes. São lindos em suas cores e aquele bicão, que a gente não sabe como consegue equilibrar no voo.

Também tenho andejos diurnos que nem meu lagarto teiú, e os noturnos parentes próximos da linhagem do gambá. Não me amolam, principalmente porque não tenho criadouro de galináceos.

Há um bom mostruário de fauna e flora a ser apreciado nesse quintal, e sobra espaço para caramanchão, churrasqueira, mesa e bancos fixos no chão de terra e gramíneas. Numa das árvores poderá ser amarrado um balanço feito de pneu. Em outras, é possível colocar a “rede de malha branquinha e dois a sonhar dentro dela”.

O perfume de rosas se espalha, juntamente com as borboletas.

A terra é fértil, e a dezoito metros de profundidade sei da existência de água potável.

Finalizando o anúncio afirmo ter o IPTU e toda documentação em dia para a venda de porteira fechada.

Tudo certo, para receber o(a) comprador(a)!

***

A tempo: Relendo o anúncio de venda...RESOLVI NÃO VENDER MEU QUINTAL, POR NENHUMA OFERTA POR MAIS TENTADORA QUE SEJA!


Hibiscus



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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora resolveu escrever e já publicou dois livros. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia"


É teatro II

Por Elisabeth Santos

O aranha ataca outra vez.


A gente cá na Terra pensando em bomba atômica depois de tantos atos terroristas, e a chegada de um inimigo invisível trouxe espanto generalizado. Como pôde acontecer? Não temos espiões eficientes que poderiam ter trazido a notícia de uma ameaça biológica de humano para humano? Nossos avanços científicos, eletrônicos, de chips a inteligência artificial não deram conta de avisar-nos com antecedência sobre perigos que poderiam vir por costumes simples já arraigados na maioria da civilização e ora abandonados?

O que aconteceu mesmo? As respostas são diferentes umas das outras e vêm de todas as camadas sociais, crenças, costumes e regimes políticos do mundo.

Fico com esta opção:

- Já havia acontecido antes, mas ninguém pensou numa prevenção através de uma espionagem bem paga. Tipo... sei que em certas partes do mundo estão acontecendo mortes horríveis por sufocamento causado ninguém sabe porque, ou por quem. Vá lá investigar e volte para nos contar.

Aqui começa a inspiração para uma peça teatral a partir de poucas linhas bem escritas.

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Entra em cena, num palco iluminado, vestido de dourado, o homem bola rolando. Bate na parede, desenrola e espreguiça. Acabava de acordar para a realidade:

 - Certo organismo vivo minúsculo mantem todos os humanos presos em suas casas por tempo indeterminado e eu, o homem bola estava sem o que fazer. Cheguei aqui por puro acaso e tenho que fazer meu número pois há uma distinta plateia, embora de seres esqueléticos, parados e mudos. Parados, mas parecendo esperar algo novo.

Eis que surge no mesmo palco um personagem esquisito falando sozinho. Depois outro, e outro, e mais outro. As conversas deles não fazem sentido por não se encaixarem em idiomas reconhecidos pelos responsáveis pela peça teatral.

- Esta peça não está agradando...

- E, no entanto, nenhum dos esqueletos da plateia se manifesta...

- Claro que não seu Idiota. Não percebe que são de papelão. Todo mundo tá nos assistindo pelo celular. Ninguém pode sair de sua casa em tempos nefastos como os que estamos vivendo Zé Mingué!

_ Hei colega! Muita calma nesta hora. Não queiramos nós, pobres mortais, atrapalhar ainda mais a problemática. Voltemos ao trabalho.

_ Não acho sermos suficientes para a “solucionática”. Quero ajuda da Gisele, a espiã nua que abalou Paris; preciso urgente do sr. Zero Zero Sete aqui, e agora. Tragam também todos os bons detetives desde o que diz: - Elementar meu caro Watson, até o Bolinha de Eugen, com sua lupa e a frase finalizadora de buscas resolvidas... ”O Aranha ataca outra vez”.

Começa a busca dos sinais: onde, como, quando e o porquê do CORONA passar de animais selvagens para humanos. Essa foi fácil:- Na fome, estes engoliam aqueles!

No palco chegou um dragão a ser morto, e devorado por aldeões.

Cena tenebrosa!

Em seguida Gisele, usando seus conhecidos métodos da época em que valiam de alguma coisa, descobriu um grupo de biólogos e cientistas NERDS, que por falta de serviço no ramo foram atuar num seriado televisivo. Ela, Gisele, conseguiu o retorno deles aos laboratórios, buscando a biografia do novo vírus, tipo: onde nasceu, por onde passou, porque se hospedou com humanos. Descobriram tudo que era preciso, mas no exato momento de testar antídoto para liberar produção em massa... o material acabou.

Entra Zero Zero Sete. Foi atrás de quem poderia auxiliar. Precisou do reforço de seus colegas de todo o mundo redondo, achatado nos polos.

 Precisava pagá-los pois sustentavam famílias. Não achou o vil metal em lugar algum que estivesse ao alcance de suas poderosas mãos. Ouviu dizer que estaria na bolsa. Que bolsa? Nunca chegou a saber nem de que material era feita. Melhor dizendo, a coisa demorou tanto que o vírus foi hibernar, a doença esteve sob controle, e ninguém se interessou em investir em algo de lucro incerto, e demorado.

Daí a gente simples da aldeia Palco Iluminado, o Bola vestido de dourado e mais o Bolinha, se juntaram. No Clube do Bolinha meninas já eram aceitas. Uma delas, que comia melancia, ensinou a todos a devorarem vegetais e não animais. A coisa começou a melhorar a partir de então.

Foi a partir da mudança de hábitos, inclusive o pior deles que era juntar dinheiro sendo que ninguém o come... que nosso mundo voltou a florescer.

Escutei esse versinho, ou foi pura impressão minha: “Mundo, mundo, velho mundo. Se eu me chamasse Raimundo, seria uma rima... não uma solução”.


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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora resolveu escrever e já publicou dois livros. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia".


dezembro 11, 2020

As gavetas

Por Elisabeth Santos


E chegou o dia de limpar e organizar gavetas. Pensei que levaria um dia. Já nem sei quantos dias estou a desenvolver essa tarefa. Só em uma gavetinha de penteadeira levei vinte e quatro horas divididas em dois dias. Primeiramente tenho que confessar que a tal gaveta já se encontrava entupida a ponto de nem fechar direito. Tirei pentes e escovas de cabelo pendurando-os onde pudesse usa-los sempre que pretendesse sair de casa. Tenho cabelos rebeldes. Se o tempo está úmido ficam ouriçados. Se o tempo está seco pioram, porque levantam voo ao primeiro vento. Em dias normais, submetendo-os às hidratações regulares, até que ficam assentadinhos. A “moça do tempo” falou na televisão que vem chuva lá na serra? Tenho que passar as dez escovadelas na cabeleira para que os fios agradeçam e fiquem com as ondas nos lugares certos, e não como se fosse dia de ressaca na orla. Por essa, e mais outras, onde vou compro outros tipos de escovas de cabelo, para teste. Também gosto de trocar por modelos novos, cores diferentes.

Voltando à arrumação da pequena gaveta achei: mini secador e chapinha. Será que ainda funcionam? São próprios para levar em viagens, e nem sei há quanto tempo não saio em excursão. Testei. Precisam de uma arribada. Separei-os para levar ao consertador qualquer dia desses, e volta-los aos devidos lugares.

E assim fui separando maquiagens, de pomadas e cremes hidratantes. Presilhas, elásticos, tiaras e tique taque próprios para os penteados, combinando com roupa e ocasião.

 Para o Serviço? Tudo discreto.

 Festividades e comemorações à noite? Brilhos, sedas e veludos.

 Tenho que explicar por que não tenho, nem uso prendedor de cabelo conhecido como piranha? Ainda bem que não.

 Enfim cheguei ao fundo da gavetinha para retirar e trocar o forro emborrachado que não deixa os pequeníssimos objetos como tarraxas de brincos, ficarem rolando pra cá e pra lá no abre e fecha diário, e constante, daquele esconderijo. Surpreendi-me com as miudezas ali encontradas: de grampos a parafusos caídos de algum lugar, uma gama de objetos, que eu já havendo dado como desaparecidos, havia comprado outros em substituição. Eram coisas que comumente se ganha de brinde ou no serviço de bordo do avião. A pasta dental para uso único, tinha virado pedra; Clipes para papel, enferrujados; gominhas grudadas umas nas outras; Fones auriculares, com fio enrijecido, e tantas outras coisas indispensáveis numa pochete de turista, que nunca sabe ao certo, a dificuldade a encontrar pela frente.

Saiba o leitor, que um simples grampo é capaz de destravar uma fechadura. Uma pastilha de menta substitui o creme dental para se dar “bom dia” à vizinha de poltrona ao amanhecer no ônibus, que leva a excursão. Uma gominha de borracha tem mil e uma utilidades. Uma moeda decide quem ganha no “Cara ou Coroa”. O colírio que substitui a lágrima poderá até desentupir narinas numa emergência.

E de gavetas médias, a grandes e pequenas, retirei coisas que poderiam ser hoje obsoletas das quis muita gente nem irá lembrar-se. Para que servem mesmo os enormes guardanapos de tecido igual ao da toalha, que outrora limpavam bocas sem batom? Substituídos por guardanapos descartáveis em diversos feitios e cores, poucos sabem do uso deles no colo em hora de refeições. Afinal muitos banquetes foram preteridos por churrascos à beira da piscina.

 E nos quartos estavam os peignoirs, literalmente abandonados às traças! Ainda são usados para recompor quem está acordando em pijamas de listras?

As gavetas dos armários da cozinha foram as que mais surpreenderam-me pelo enorme número de ferramentas de usos bem específicos mesmo. Os anúncios televisivos que me levaram a adquiri-las certamente foram muito tentadores. Cheguei a reconhecer alguns objetos como: furador de coco, ralador de pimenta, concha de servir sorvete, saca tampinhas de garrafas, e escorredor de arroz. Os demais separei em duas turmas. De um lado utensílios culinários que fizeram por merecer aquele espaço quando havia crianças, e idosos na casa. Os que nem eu, que marquei presença naquela cozinha por longos anos, consegui lembrar-me para que serviram um dia, se é que foram usados.

Essa atividade de hoje me levou a pensar:

- Há mais coisas engavetada aqui, do que a maior imaginação supõe!

- Só um isolamento social forçado haveria de fazer-me pegar uma tarefa dessas com bom humor!

Diriam meus descendentes:

- `Bora pro novo tempo!



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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora resolveu escrever e já publicou dois livros. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia"

dezembro 04, 2020

É peça teatral

Por Elisabeth Santos


Sempre estive curiosa para saber como, que jeito, de uma história singela, romance de trinta páginas no máximo, pode ser criada uma peça de teatro emocionante. Já vi muitas, mas levei algum tempo para optar pelo item é “olho clínico”. Sabe aquele texto, que o especialista olha uma única vez e diz: já estou imaginando o cenário, os atores (amadores e profissionais), diálogos, figurino dos personagens, o elemento surpresa e quem ficará com quem?

Pois é!

Pode ser, que assim de cara “o gênio” da encenação profissional ainda não tenha um final para a peça. Também, né gente, ele terá que ter algum trabalho. Caso contrário todos nós poderíamos fazer, no mínimo, uma peça de teatro. A da nossa vida, pô!

Então vou atrás de sugerir. Ninguém pediu, mas estou afim, e faço o que quero da minha quarentena e da sexta-feira santa confinada.

...

Entrou o Zé Mané afobado, suado e gritando:

- O mundo tá virado de cabeça pra baixo.

- Plantando bananeira? É isso que você quer dizer Zé?

- Não. Quem vira de ponta cabeça, e a gente fala “plantou bananeira”, é mulher vestida de saia. Esta roupa é atraída pela gravidade, então fica parecendo o pé da banana. É o mundo mesmo que tá virado!

- Vou ver.

Chegando na sala, Márcio olhou o quadro de cinco mil pecinhas de quebra cabeça pendurado na parede e... estava mesmo de ponta cabeça (se é que aquele mapa em forma de esfera pudesse ter Ponta e Cabeça). Tudo linguagem simbólica, pois o dono da casa já tinha matado a charada:- Dia anterior fora dia da faxineira que retirou o quadro enorme, cujo prendedor na parede era um barbante sedoso e comprido por detrás. Sem perceber, porque circunferência não sinaliza qual lado deverá ficar para cima... Enfim o mal entendido estava apenas começado.

Só que não, para espanto dos outros moradores da casa. Zé Mané afirmava ter visto coisas. Cada qual tinha sua opinião e tratou de externar.

O cenário muda.

A situação no mundo mudou emudecendo rostos estupefatos. Quem não saia, teve que sair para acudir. Quem saia a dar voltas ao mundo, teve que ficar morando no veículo condutor por terra, ar ou mar!

Falavam em corona-vírus. Ouvia-se coroa viva. Não existia plano B ou carta de baralho na manga. Todos prisioneiros de um contingente desconhecido queriam descobrir o que seria aquilo. Nostradamus? Apocalipse? Nova era? Era nova? Tudo junto misturado?

O maior dos curiosos foi consultar o oráculo sabendo de antemão que ele sim respondia perguntas. Quero dizer, o curioso arguia: - É isso? É aquilo? Aquilo outro?

Tipo vestibular e suas múltiplas escolhas.

Dessa vez o oráculo dizia, sem responder, e repetia sem parar:

_ Só dessa primeira e última vez, eu quem faço a pergunta que não quer calar: - O que vocês, os racionais, andaram aprontando aí no planeta Terra hein? Hein? Podem dizer que eu perdoo. “Quem diz a verdade não merece castigo” (o oráculo citava por não estar inspirado para usar sua sabedoria). Continuando deu a sentença: - Tratem de consertar o mal feito, e rápido!

Cada qual pegou sua vassoura varredora, não voadora para outro planeta, e foi arrumar a casa das gentes.

Voltando ao aconchego do lar, sr. Márcio e família, viram as pecinhas do quebra-cabeças, existente na sala de estar, esparramadas no assoalho. Começaram a catar para tentar recompô-lo.

...  

Não sei se ficou igual porque cochilei.





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novembro 27, 2020

Tempo Colegial

Por Elisabeth Santos

Foto: Marcelo Di Carli

Quem teve o tempo de colégio interno, algumas lembranças há de ter. Muito estudo, disciplina rigorosa, horário definido para cada atividade, professores exigentes, recreios curtos, longas esperas para feriados prolongados em casa, e amigos fiéis sempre prontos a burlar as regras gerais e aprontar alguma arte que nada tinha a ver com atividade artística.

Começando a descrever do último andar do prédio colegial, meu tio de idade avançada e memória nem tanto, contava aos sobrinhos netos ao seu redor:

“Lá no alto, perto da caixa d’água e do para-raios, tínhamos de espantar urubus da escada metálica existente do primeiro telhado ao seguinte e descermos de costas, segurando nos próprios degraus.

Ali era o nosso posto de sondar através de duas claraboias: a que iluminava o altar da capela; a da escadaria dupla a descer ao andar seguinte. Da primeira, espionando de cima para baixo e de fora para o interior do colégio, visualizávamos nossos colegas contritos decerto a orar pelas boas notas nas provas. Da segunda claraboia, chegávamos a ficar tontos observando as fileiras de alunos subindo ou descendo que nem correição de formigas ou desenho de Maurits Cornelis Escher.

Agora é hora de entrar sorrateiramente pela varanda e descer mais um ou dois lances de escada para acabar com a espionagem quase secreta, e adentrar na sala de aula como se nada tivesse acontecido. Se houvesse perguntas por parte do professor a resposta estaria na ponta da língua. O primeiro: - Estive no reservado. _ O segundo: - Fui à enfermaria. O último: - Fui buscar a caneta esquecida no dormitório.

Nas cabecinhas ocas, ideias para as próximas escapadelas:        

- Visita ao terreiro e caseiro.

- Banho nas águas do ribeirão onde ainda não era despejado esgoto.

- Uma pulada de muro para o bairro, e diversão com outros meninos a cabular aulas em:

_ disputa de Bafo (jogo de perde ganha de figurinhas); bolinha de gude; finca e até carrinho de rolimã emprestado, ladeira abaixo.

A frase que resumia tudo era uma tradução jocosa de ”Coeur contritum e umilliaatum Deo no espichet”.

- Couro curtido e molhado nem Deus espicha.



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novembro 20, 2020

Além da Imaginação

Por Elisabeth Santos


Discutiam certo dia, dentro da cabeça de alguém, “A PERGUNTA QUE NÃO QUERIA CALAR” versus “O QUE SERIA SE NÃO TIVESSE SIDO”. Já adiantarei ao leitor ansioso, que poderá baixar a ansiedade porque a contenda não deu em nada, ou seja... “NECA DE PITIBIRIBAS”.

Simplesmente eu no meu dever “de ver” e escrever para que eu mesma elucide, solto as rédeas da imaginação, que sai galopando por aí.

Direto ao caso que causou o maior furor, não sei aonde...

Parece-me que a tal PERGUNTA INCALÁVEL vem junto com as pessoas ao nascerem, pois TAM TA RAM a gente ouve ao fim de uma explanação alguma indagação inesperada que a ninguém dali é dada tanta sapiência a obter a assertiva resposta.

Crianças já nem querem saber como foram feitas, mas buscam onde se apegar. De vez em quando se interrogam “onde estariam” se conosco não estivessem. Para quem estiver achando que não conheceu infante assim, devolvo A PERGUNTA:

_ Por que são tão curiosos esses pequenos seres que não param um segundo sequer de OBSERVAR, MEXER, REMEXER buscando algo sem demonstrar ter noção do quê? – concluí depois de observar que crianças não demonstram satisfação de suas buscas. Não param quietas nem quando dormem. Sonham...

E onde estaríamos nós, o que estaríamos fazendo se não tivéssemos vindo a despalmilhar este chão?

Ao tornarmo-nos adultos poderemos perguntar:

_ E se eu tivesse seguido outro caminho estaria melhor de vida? - Não saberemos! Ao renunciarmos àquele trajeto poderíamos nem ter como, por que e a quem indagar. A fila anda, o tempo voa, retomar um caminho um dia preterido na opção de outro, é sem chance para muitos. Assim como a ponte a atravessar o caudaloso rio, as águas não serão as mesmas também.

Há quem concluiu da discussão proposta no primeiro parágrafo que o melhor mesmo é aproveitar o que nos é dado aproveitar, pois “reinventar” nem sempre será provável ou possível.

Há quem escolha viver de ilusão, e “TUDO BEM”.

E existem pessoas que amam uma polêmica e sempre estarão questionando o inquestionável. Pode ser que encontrem seu par pensando “o que seria se não tivesse sido”.

De acordo com minha experiência... o que existe mesmo é muito “SE” nas cabeças e falas das pessoas.

Desde Rudyard Kipling a chegar à conclusão de... Poderes “da existência a que dás brilho/ aproveitar todo o minuto teu/ sem desperdício algum, então, meu filho, / és um Homem de bem e o mundo é teu!”






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novembro 13, 2020

Muito inteligente

Por Elisabeth Santos


A menina foi à aula do jardim de infância nos idos de mil novecentos e cinquenta e voltou pra casa, feliz da vida, contando a todos da família:

- A professora disse que eu sou muito “intelijada”!

De uma mistura de prefixo e sufixo verbalizou o que os adultos daquele lar sabiam de sobra: - Ilzinha nasceu inteligente e criativa e precisava de espaço, liberdade, e da paciência dos demais à sua volta para matar todas suas curiosidades infantis.

Passado mais de meio século lá estava ela às voltas com o computador, e seus avanços “internáuticos”.

Certo dia percebeu algo estranho semelhante à brincadeira de “pique esconde” no computador utilizado por ela diariamente. Este vinha com respostas aos seus questionamentos anteriores assim que aberto na internet. Achou que aquilo poderia ser uma brincadeira de mau gosto de amigos de suas redes sociais. Não era, mas não conseguia detectar a fonte de onde jorravam.

E a Dona Ilza resolveu em nome de suas atividades de pesquisa, leitura e escrita... tocar o barco, independente dos anúncios que apareciam no decorrer do dia ao computador.

Não eram só anúncios comerciais. Apareciam matérias sobre assuntos que lhe interessavam... Se bem, que repletos de cookies. Até vinham esclarecimentos sobre a utilização destes, mas eram tantos que chegavam a prejudicar a qualquer usuário da rede. Principalmente idosos.

Certo dia, impaciente com tantas mensagens intrometidas em sua vida de leitora e escrevinhadora resolveu chamar um técnico e saber direitinho o que poderia estar acontecendo de errado ali. Ele fez o trabalho dele certinho, dando uma limpeza, atualizando antivírus, e instruindo-a quanto aos cliques perigosos por mares nunca dantes navegados por ela.

Dona vovó chegou a perguntar ao profissional dos computadores se estaria ela sendo sondada. À resposta negativa do moço, desestressou. Dali a pouco ele declara convincente:

_ Tudo que a senhora vê agora, e a intriga, vem da Inteligência Artificial.

- O quê? Mais esta agora para eu aprender. Só faltava isto.

- Não. Sinto ter que dizer-lhe que ainda vem muito mais coisas por aí. Prepare-se Dona vovó Ilza. Não se trata somente do que a nossa vã filosofia sonhava. Agora temos Física, Química e todas as outras ciências conhecidas na Terra envolvidas em trabalhar para conhecermos mais.

- Então... que Deus nos acuda, e venha o que vier de proveitoso para o bem das outras gerações!




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novembro 06, 2020

Inédito

Por Elisabeth Santos

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Meu próximo texto terá esse título aí. Quem sabe alguém tenha a curiosidade em lê-lo, não é mesmo?

Além do ineditismo vou recheá-lo dos assuntos apropriados a ganhar novos leitores. O leitor dessas mal traçadas linhas poderá perguntar-me que temas eu abordaria, sem receber uma resposta elucidativa de minha parte. Inédito é inédito. Se eu ficar proclamando aos quatro ventos o que está contido ali, depois da capa ser aberta, serei incoerente. A brincadeira vai perder a graça!

Numa entrevista improvável de acontecer do jeito que imagino, alguma rede televisiva talvez me arguisse começando por essa máxima: - Por que você publica seus escritos?

Calmamente eu ponderaria: - Minha mente não para de ter ideias. Para que eu consiga cuidar da minha vida como devo, tenho que escrever. Se escrevo e arquivo aquilo fica martelando meu pensamento. Quando divulgo sinto-me livre para outro texto a povoar minha mente. Não sei o que será o fim disso, nem o que o Serafim disse! Vou escrevendo. Vou divulgando. Em tempos de isolamento pandêmico vem a ser uma solução razoável.

Não canso de desculpar minha vontade insaciável de transformação de pensamentos em letras achando ser um incentivo para quem, não sendo escritor ou escritora, leve a cabo sua vontade de escrevinhar, e divulgar.

Pode ser uma bobeira, mas faz parte do problema.

Quando eu era criança, já alfabetizada, escrevia cartas e mais cartas para meu pai que viajava a serviço, para vovó que residia em outro Estado, e para alguns dos meus irmãos que estudavam em cidades distantes. Parabenizava-os pelo aniversário; descrevia as comemorações locais; desejava-lhes Feliz Páscoa mesmo sem entender direito o significado, e contava poucas novidades. Com minha melhor letra conseguia preencher uma ou duas páginas no máximo. Se datilografadas, caberiam três cartas numa folha de papel ofício.

A segunda pergunta que o entrevistador certamente me dirigiria, acho que ia ser sobre o mix que costumo fazer de linguagem formal, vocabulário culto, palavras populares ou gírias do momento, em meus escritos. Sentir-me-ia embaraçada para responder. É que eu quero sentir-me próxima do leitor seja lá com a idade ou formação escolar que possua. Se ele conseguir identificar-se com um vocábulo utilizado por mim numa página que seja, já estarei satisfeita. Isso não é bobeira. É bem mais. É sentimentalismo puro!

 Já vivi bastante, lustrei muitos bancos de aprendizado, convivi com pessoas diferentes, viajei... Entretanto até hoje não consegui separar, classificar, ordenar por ordem crescente ou decrescente tudo que é pensamento que me dá na telha.

Sou capaz de engabelar qualquer mente perniciosa iludindo-a com a questão maior: “Ser ou não ser”.

Pessoas querendo saber de mim, o que eu mesma ainda desconheço, assustam-me. Parece que estão querendo ver-me do avesso, sem outro objetivo que não seja de satisfação própria. -‘Tô fora!

Mas, afinal querem mesmo saber de algo inédito, que seja lido e comentado pelos maiorais do assunto “escrever e ler”? muitos de nós que somos da escrita gostaríamos muito de saber...

A situação inverteu-se e caiu numa pesquisa difícil, que resumo aqui em duas simples respostas:

- Os que leem para ter assunto com leitores assíduos.

- Os que leem por gosto ao ineditismo, seja de abordagem de um tema, ou do autor desconhecido parecendo querer se infiltrar num meio ao qual ainda não pertence.

- E quem acha que pertence, tem certeza disso no universo da escrita e leitura?

“Eis a questão”.



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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora (não de Português) resolveu escrever. Colabora com o jornalzinho da família, participa de concurso cultural e coleciona seus textos para publicar oportunamente. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia".


outubro 30, 2020

Procurações

Por Elisabeth Santos



O pior de se estar perdendo a memória é a pessoa gastar tempo em procurações. Procura daqui, procura dali, mas nem sempre acha. Tanta gente sem procurar confusão e achando em toda parte que vai... e a pessoa idosa nem isso consegue achar.

O pior mesmo é procurar onde colocou seus óculos sem eles. Como haveria de enxerga-los com tanto desgaste de envelhecimento das células através dos anos de vida? Também por que encomendou armação de óculos moderninha? Assim é, que ela fica mesmo invisível ao olhar perscrutador sobre qualquer superfície! Nada de dar desculpa fajuta à evidência a essas alturas da vida. É tratar de procurar.

 Ao achar os benditos, o procurador explica para alguém de boa vontade, e que esteja por perto, seu drama pessoal. E não é que a solução aparece? Encomendar outros óculos. Características: leve, para não ferir a pele do nariz; colorido em cor vibrante, sem medo de ser feliz; nem pequenos, nem enormes; mesmo grau nas lentes daquele par que vai para a ótica de modelo; estojo vermelho brilhante; e por enquanto nem pensar em chip detector do chamado:

 - Onde estás meu amor, luz dos meus olhos, rei da minha autonomia?

E agora só falta decidir-se onde vai guardar o estojo que contem o que há de mais precioso no momento: seus óculos sobressalentes. Nem pensar em esconderijo! Gaveta também não. Poderá mofar ali engavetado. Que tal pendurado em frente ao espelho? Ou num cabide do guarda roupas? Sobre a penteadeira? Também não, pois um esbarrão acidental poderá derrubar o precioso. Mas enfim já está prometido e juramentado: sempre no mesmo lugar.

Então na próxima procuração de seus óculos, alguns anos depois, foi bem assim:

_ Onde estou: sala, quarto, cozinha ou banheiro? Tirei os óculos para limpá-los, para dormir, para não engordurar, ou foi para tomar banho?

Melhor pendurá-los ao meu pescoço.

- Alguém aí me ajuda com outras sugestões, por favor? Já operei catarata e retina viu? Ah... já existe cirurgia de memória? Não? Então o que foi que você falou aí? Acho que estou ficando surda...




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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora resolveu escrever e já publicou dois livros. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia".

outubro 23, 2020

Do lado de lá

Por Elisabeth Santos


Tratava-se de uma família numerosa e cheia de amigos, agregados, e também de amigos dos aparentados. Quando se reuniam, enchiam uma Pousada e ainda sobrava gente para lotar o pátio interno e o calçamento à entrada da porta principal. Ainda assim iam chegando casais empencados de filhos, e netos. Todos acostumados com o ambiente, iam se ajeitando, se servindo, tomando seus lugares. Não estava estipulada hierarquia, pelo respeito à tradição prevalecia a lei “quem chega primeiro escolhe onde quer ficar”. Os grupos iam desenrolando assuntos sérios, e também os divertidos. Quanto a estes, se fossem analisados à luz das normas estabelecidas nos últimos anos, eram diálogos entremeados de anedotas preconceituosas. Os que bebiam bebidas alcoólicas riam às bandeiras despregadas. Os que bebiam sucos de frutas, saiam quando o clima pesava, davam uma volta por ali, se apresentavam aos novatos da turma, e retornavam ao grupo de origem.

As crianças se misturavam de tal forma, correndo de lá para cá, que algumas vezes lhes chamavam a atenção, e não eram seus pais! Depois se desculpavam: - Olhei rapidamente e achei que eram os meus filhos correndo risco de se machucarem. Essa criançada se parece muito. O autor da censura, constrangido, se explicava pelo engano.

 Tudo terminava bem.

Ali, a prosa sempre podada era a de se gabarem de suas façanhas. Afinal de contas, todos sem exceção tiveram, em algum dia da vida, local mais propício para se enaltecerem. Uns foram pescadores de grandes peixes, outros plantadores de altas árvores, além dos que: criaram animais de crescimento fora do comum, construíram de pinguelas a pontes ou se tornaram louvados e glorificados por feitos humanitários.

Do lado de lá, donde vieram tais informações, ninguém desejava ser mais ou maior que o outro. Local da paz e do bem. As desavenças ou simples divergências de opiniões não viravam brigas de egos.

Eis que surge a pandemia e deu-se início a chegada ao grupo “paz e amor”, muitos revoltados querendo descobrir, inclusive, os responsáveis pelos transtornos do lado de cá.

Estes especulavam, levantavam questões de difícil raciocínio, lançavam hipóteses, julgavam com os dados que tinham, apontavam culpados sem conseguir provar a origem verdadeira da pandemia. Talvez não tivessem conseguido até então determinar “a origem” por não ter sido uma causa única. Misturando-se aos “do lado de lá”, quem sabe conseguiriam?

 Se iria adiantar de alguma coisa ninguém poderia afirmar. Tinham fé. Se estaria, ou não, sendo tarde demais... desconheciam também.

Apostando na ideia de evitar outros pecados dali pra frente, entabularam diálogos sem fim. Se, ainda não chegaram a um consenso decerto chegarão ao desfilar das aguardadas próximas gerações.

Lamentavelmente muitas vidas se foram, mas o nosso mundo ainda não acabou. Pode ser que ainda haja tempo. Palavras da turma do lado de lá, esperançosa de que os chegantes absorvam a paz e o amor, depois de muita discussão sobre o hipotético questionamento: - “Quem veio primeiro: o ovo ou a galinha?”


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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora resolveu escrever e já publicou dois livros. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia"