E chegou o dia de limpar e organizar
gavetas. Pensei que levaria um dia. Já nem sei quantos dias estou a desenvolver
essa tarefa. Só em uma gavetinha de penteadeira levei vinte e quatro horas divididas
em dois dias. Primeiramente tenho que confessar que a tal gaveta já se
encontrava entupida a ponto de nem fechar direito. Tirei pentes e escovas de
cabelo pendurando-os onde pudesse usa-los sempre que pretendesse sair de casa.
Tenho cabelos rebeldes. Se o tempo está úmido ficam ouriçados. Se o tempo está
seco pioram, porque levantam voo ao primeiro vento. Em dias normais,
submetendo-os às hidratações regulares, até que ficam assentadinhos. A “moça do
tempo” falou na televisão que vem chuva lá na serra? Tenho que passar as dez
escovadelas na cabeleira para que os fios agradeçam e fiquem com as ondas nos
lugares certos, e não como se fosse dia de ressaca na orla. Por essa, e mais
outras, onde vou compro outros tipos de escovas de cabelo, para teste. Também
gosto de trocar por modelos novos, cores diferentes.
Voltando à arrumação da pequena gaveta
achei: mini secador e chapinha. Será que ainda funcionam? São próprios para
levar em viagens, e nem sei há quanto tempo não saio em excursão. Testei.
Precisam de uma arribada. Separei-os para levar ao consertador qualquer dia
desses, e volta-los aos devidos lugares.
E assim fui separando maquiagens, de
pomadas e cremes hidratantes. Presilhas, elásticos, tiaras e tique taque
próprios para os penteados, combinando com roupa e ocasião.
Para o Serviço? Tudo discreto.
Festividades e comemorações à noite? Brilhos,
sedas e veludos.
Tenho que explicar por que não tenho, nem uso
prendedor de cabelo conhecido como piranha? Ainda bem que não.
Enfim cheguei ao fundo da gavetinha para
retirar e trocar o forro emborrachado que não deixa os pequeníssimos objetos
como tarraxas de brincos, ficarem rolando pra cá e pra lá no abre e fecha diário,
e constante, daquele esconderijo. Surpreendi-me com as miudezas ali
encontradas: de grampos a parafusos caídos de algum lugar, uma gama de objetos,
que eu já havendo dado como desaparecidos, havia comprado outros em
substituição. Eram coisas que comumente se ganha de brinde ou no serviço de
bordo do avião. A pasta dental para uso único, tinha virado pedra; Clipes para
papel, enferrujados; gominhas grudadas umas nas outras; Fones auriculares, com
fio enrijecido, e tantas outras coisas indispensáveis numa pochete de turista,
que nunca sabe ao certo, a dificuldade a encontrar pela frente.
Saiba o leitor, que um simples grampo
é capaz de destravar uma fechadura. Uma pastilha de menta substitui o creme
dental para se dar “bom dia” à vizinha de poltrona ao amanhecer no ônibus, que
leva a excursão. Uma gominha de borracha tem mil e uma utilidades. Uma moeda
decide quem ganha no “Cara ou Coroa”. O colírio que substitui a lágrima poderá até
desentupir narinas numa emergência.
E de gavetas médias, a grandes e
pequenas, retirei coisas que poderiam ser hoje obsoletas das quis muita gente
nem irá lembrar-se. Para que servem mesmo os enormes guardanapos de tecido
igual ao da toalha, que outrora limpavam bocas sem batom? Substituídos por
guardanapos descartáveis em diversos feitios e cores, poucos sabem do uso deles
no colo em hora de refeições. Afinal muitos banquetes foram preteridos por
churrascos à beira da piscina.
E nos quartos estavam os peignoirs,
literalmente abandonados às traças! Ainda são usados para recompor quem está
acordando em pijamas de listras?
As gavetas dos armários da cozinha
foram as que mais surpreenderam-me pelo enorme número de ferramentas de usos
bem específicos mesmo. Os anúncios televisivos que me levaram a adquiri-las
certamente foram muito tentadores. Cheguei a reconhecer alguns objetos como:
furador de coco, ralador de pimenta, concha de servir sorvete, saca tampinhas de
garrafas, e escorredor de arroz. Os demais separei em duas turmas. De um lado
utensílios culinários que fizeram por merecer aquele espaço quando havia
crianças, e idosos na casa. Os que nem eu, que marquei presença naquela cozinha
por longos anos, consegui lembrar-me para que serviram um dia, se é que foram
usados.
Essa atividade de hoje me levou a
pensar:
- Há mais coisas engavetada aqui, do
que a maior imaginação supõe!
- Só um isolamento social forçado
haveria de fazer-me pegar uma tarefa dessas com bom humor!
Diriam meus descendentes:
- `Bora pro novo tempo!
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