Foto: Marcelo Di Carli |
Quem teve o tempo de colégio interno, algumas lembranças há de ter. Muito estudo, disciplina rigorosa, horário definido para cada atividade, professores exigentes, recreios curtos, longas esperas para feriados prolongados em casa, e amigos fiéis sempre prontos a burlar as regras gerais e aprontar alguma arte que nada tinha a ver com atividade artística.
Começando a descrever do último andar
do prédio colegial, meu tio de idade avançada e memória nem tanto, contava aos
sobrinhos netos ao seu redor:
“Lá no alto, perto da caixa d’água e
do para-raios, tínhamos de espantar urubus da escada metálica existente do
primeiro telhado ao seguinte e descermos de costas, segurando nos próprios
degraus.
Ali era o nosso posto de sondar através de
duas claraboias: a que iluminava o altar da capela; a da escadaria dupla a
descer ao andar seguinte. Da primeira, espionando de cima para baixo e de fora
para o interior do colégio, visualizávamos nossos colegas contritos decerto a
orar pelas boas notas nas provas. Da segunda claraboia, chegávamos a ficar
tontos observando as fileiras de alunos subindo ou descendo que nem correição
de formigas ou desenho de Maurits Cornelis Escher.
Agora é hora de entrar
sorrateiramente pela varanda e descer mais um ou dois lances de escada para
acabar com a espionagem quase secreta, e adentrar na sala de aula como se nada
tivesse acontecido. Se houvesse perguntas por parte do professor a resposta
estaria na ponta da língua. O primeiro: - Estive no reservado. _ O segundo: -
Fui à enfermaria. O último: - Fui buscar a caneta esquecida no dormitório.
Nas cabecinhas ocas, ideias para as
próximas escapadelas:
- Visita ao terreiro e caseiro.
- Banho nas águas do ribeirão onde
ainda não era despejado esgoto.
- Uma pulada de muro para o bairro, e
diversão com outros meninos a cabular aulas em:
_ disputa de Bafo (jogo de perde
ganha de figurinhas); bolinha de gude; finca e até carrinho de rolimã emprestado,
ladeira abaixo.
A frase que resumia tudo era uma
tradução jocosa de ”Coeur contritum e umilliaatum Deo no espichet”.
- Couro curtido e molhado nem Deus
espicha.