Por Elisabeth Santos
Em ponto de marca no vestidinho... a viagem que eu
faria em roda de mim.
Adélia Prado
Sem dúvida que tive um vestido por um barquinho enfeitado. Dentro dele antevia minha única viagem em roda de mim. Estou nela! Se não estivesse não me assentaria ao computador para registrar, e depois eternizá-la na internet. Imagino sim, o que for pela Net nunca será apagado, e é dessa eternização que ora necessito!
Vamos à história que originou o título dado por mim:
Da página dedicada à moda, do jornal publicado no Rio
de Janeiro (1958), saiu o vestidinho rosa e verde confeccionado sob minha
medida.
Foi uma dificuldade achar um desenho de caranguejo
para compor aquela barra de barquinho, peixes e bolhas de oxigênio n’água. E eu
daquele verde mar e rosa crepúsculo cercada... Me achei! Por um ano foi meu
vestido de missa dominical, festa de aniversário, data comemorativa... Depois
disso não serviu mais e deixei de lado minha infância, não os meus sonhos de
conhecer o mar por exemplo. Então pontinhos de marca, marcaram sim minha
passagem para a pré-adolescência. Tirei este termo da enciclopédia “O Munda da
Criança” e enchi minha cabeça do ideal de não permanecer criança por mais
tempo. Enchi também a paciência dos adultos da família corrigindo-os o tempo
todo: _ Não sou mais criança. Completei onze anos, sou quase adolescente!
Pra que tanta pressa meu Deus? Ali sossegada rodeada
de outras crianças para brincar, e tendo somente como obrigação idas à escola e
à igreja... Por que haveria de querer avançar etapas de desenvolvimento? Acho
que de longe a liberdade acenava-me. Não tinha, ou não queria enxergar as
responsabilidades que viriam juntas. Ou, quem sabe, tinha ideia sim de direitos
e deveres e pensava que daria conta, tiraria de letra?
Já não queria brincar de casinha, mas os jogos
despertavam-me tanto interesse quanto os olhares trocados com o sexo oposto.
Apelo inspiração à Adélia Prado indagando-me saudosa:
_ “E quem me olhará de novo com o mesmo olhar que me olhou aos quatorze anos?” (que
poderiam ser... doze, treze, ou um pouco menos, ou muito mais?). Novos
hormônios em ação fizeram rebuliço na minha vida de viajar pelo tempo.
Em roda de mim novidades, e por dentro vivências que
me fizeram madura para enfrentamentos. Tudo que foi um dia surpreendente,
depois virou episódio comum, repetitivo, rotina sem jamais perder o valor da
experiência a deixar valorosa lição.
Estou na minha viagem.
Ninguém poderá vive-la por mim.
Nada de bom que dependa da minha livre vontade terá
força, ou poder do contrário! A roda girará sempre pelo passar do tempo. O
tempo dirá:
_ O que será.
Eu afirmarei meu desejo.
Aqui posso escrever o que penso hoje.
É engraçado.
Sem despir-me do primeiro vestido, mesmo não sendo de
“marca”, trazia o ponto de marca (ou de cruz) em motivos marinhos... E relembro-me
das etiquetas de origem em cada roupa que usei ultimamente. Eu as vejo rodeando
o espaço: China; Bangladesh, Vietnam; Indonésia; Índia; EUA; Italy; France...
Passam em minha cabeça pensante, as feições das
pessoas que estiveram envolvidas na feitura de cada peça vestida por mim ao
longo dos anos. São de olhos puxados, amendoados, ou redondos; tem a pele que
vai da cor branca, amarela, avermelhada ao marrom em diversos tons; falam
enrolado, cantado, pausado ou de “soquinho” (como se estivessem a soletrar em
minha cartilha); sérias, compenetradas, sofridas, ou sorridentes estão a
trabalhar e pensar em suas vidas.
E eu aqui querendo no tempo e no espaço, sair em roda
do mundo, a cumprimentar e agradecer cada uma delas.
Esta seria uma outra viagem...
Concluo: _ Enquanto dou uma volta ao redor de mim, o
mundo gira, gira e gira. As pessoas e o tempo passam. As lembranças permanecem.
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