julho 06, 2018

Nosso casarão


Por Elisabeth Santos


Em 1948 chegaram de Aracaju a Campanha, sul de Minas, Milton, Margarida e nove filhos. Alugaram esse casarão onde residiram, tiveram e criaram mais seis filhas. A casa não era nova, conservava no porão umas peças de ferro usadas para manter presos negros escravizados.

Logo de chegada ao interior do estado, os meninos mais velhos da família recolheram esses objetos e doaram ao museu local.

Lá existe até hoje boa quantidade de coisas desse tipo, e visitantes sensíveis nem visitam o setor “tempo da escravidão” por não se sentirem bem. Outros passam rapidamente. Crianças olham curiosas e perguntam que parte do corpo esses ferrolhos prendiam: Pescoço, punhos, canelas?

Nosso casarão passou a ser nosso, com escritura e planta baixa registrada no final dos anos cinquenta, e aí sim pode ser reformado para comportar a família, a babá, além de outros serviçais esporádicos, muitos parentes, amigos, conhecidos e mendigos. Observem bem na porta de entrada um coraçãozinho com os dizeres “Assistência aos Pobres”. Aquela plaquinha ali era levada a sério.

Nessa reforma a casa ganhou mais dois banheiros, dois quartos, lavanderia no porão, e o depósito de água com bomba elétrica para suprir duas caixas, e ainda reservar.

Posteriormente o fogão de lenha foi substituído pelo fogão a gás, e chuveiros que ainda tinham água aquecida na serpentina, foram trocados por elétricos.

Embora já tivéssemos ganho do Tarcísio um moderníssimo fogão de cinco bocas e dois fornos... não achávamos cozinheira que quisesse aprender, e perder o medo de manejá-lo.

Mamãe não dispunha de tempo para tal, pois trabalhava no Correio com o papai. Se me perguntam hoje como é que ela dava conta de todos seus afazeres de dona de casa, esposa de executivo que viajava bastante, mãe de quinze filhos, e todos os demais compromissos sociais, religiosos, culturais etc. eu responderia:

_ Com serenidade, ciente de estar cumprindo sua missão na Terra.

Enquanto criança foi marcante para nós, as seis campanhenses, as brincadeiras e jogos no quintal. Na adolescência tivemos uma quadra de vôlei que permanece, e a mudança da “eterna” mesa de pingue pongue transportada para o “rancho” que permitia recebermos amigos e amigas a formar equipes e times.

Essa casa foi muito importante para todos nós da família: dos Marques e dos Carvalhos, e de outros sobrenomes que se foram juntando em uniões matrimoniais, e gerando descendência até os dias atuais.



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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora (não de Português) resolveu escrever. Colabora com o jornalzinho da família, participa de concurso cultural e coleciona seus textos para publicar oportunamente. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia". 

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