janeiro 22, 2021

Escrevendo novela

Por Elizabeth Santos

   


Se o produtor de um filme quer sucesso de bilheteria tem que estar atento às imagens que precisa mostrar; as necessárias a passar realismo ao espectador; às que apenas sugerem acontecimentos, e por fim, aquelas imagens misteriosas a despertar a curiosidade, e manter o interesse para assistirmos até o final.

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Então aparece um cara montando cavalo, escondendo um punhal no cano da bota, e pegando a estrada no galope ligeiro... e a gente deduz que vai haver briga.

Dali a pouco, num suntuoso cenário interno, de adornos, flores e jóias surge uma família de três gerações, e a conversa é sobre uma mudança de país. Fácil, fácil quem assiste ao filme sabe que ali estão pessoas ricas, e novidades surgirão.  

Se em determinada cena é mostrado o galã roubando um beijo da mocinha é para o público daquele filme entender, que ali está um personagem ousado. Nem precisará roubar outros beijos.

E daí, numa escuridão chuvosa, um vulto se move sorrateiramente, esbarra e derruba algo que pode ser uma lixeira! No cinema ninguém consegue disfarçar o susto, aliviado somente quando em determinada janela brilha uma luz, e...

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_ e... o quê?

Nestas poucas linhas, temos elementos suficientes para desenrolar um filme completo de, mais ou menos, duas horas de duração.

Novela não é assim! Novela é algo enovelado semelhante a um novelo de fio que poderá desenrolar e tecer tramas de todo e qualquer tipo sob um título, ou uma etiqueta só.

Novela tem várias horas de duração, é dividida em capítulos recheados de episódios, muito mais personagens, histórias dentro de uma história maior, e diversos tipos de enfoque.  Ela vai ao sabor da onda, digo ao gosto do(a) diretor(a), segundo o índice de audiência. Tem muitos patrocinadores, pois existem alguns embutidos que ofertam indumentárias, adereços, produtos perecíveis, serviços e marcas, que aparecem aqui e ali, e até inoportunamente.

Uma novela poderá surgir de um fato corriqueiro. Aos roteiristas caberá a contextualização, a continuidade, a finalização etc. O imprevisto está à espreita. Pode acontecer de um personagem secundário crescer na preferência popular e passar para primário. De um outro ter que sair de cena, mudando-se para local ignorado, ou até morrer de mal súbito, por não estar merecendo audiência.

Se o problema é prender a atenção do público, filma-se mais de um final. Daí algum meio de comunicação divulga o que será desvendado no último capítulo, e é só surpreendê-lo utilizando a segunda, a terceira ou a quarta opção, já pronta.

Outra coisa, que às vezes acontece é a novela precisar ser emendada devido à data propícia ao início da outra, que irá substituí-la. Mal (ou bem) comparando, pensemos no fio de uma linha fina, sedosa, de uma cor resplandecente emendado num fio de outro novelo, sem nada em comum com o inicial, só por falta de matéria prima... Pode acabar em um terrível desastre! Por isso mesmo, inicio de novela é tão monótono. Aparece um mundo de coisa que poderá gerar a liga com a extensão necessária naquele momento crucial: alguém mexendo numa velha caixa de fotografias, bem lá no iniciozinho dará origem a um assunto novo; ou uma simples paisagem; pessoa que retorna; ponto de vista, opinião, ou mesmo um sentimento que mude. Quase tudo será válido desde que se respeite o espectador.

Não vale mudar o que o personagem demonstrou ter como característica principal e virá-lo do avesso, para desvirá-lo em dez dias, só para seguir o calendário.

Seria como encher linguiça com carne estragada.



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Elisabeth Carvalho Santos desde alfabetizada lê tudo que aparece à sua volta. Depois de aposentada professora (não de Português) resolveu escrever. Colabora com o jornalzinho da família, participa de concurso cultural e coleciona seus textos para publicar oportunamente. Os assuntos brotam de suas observações, das conversas com amigos e são temperados com pitadas de imaginação e bom humor. Costuma afirmar que "escrever é um trabalho prazeroso e/ou um lazer trabalhoso que todo alfabetizado deveria experimentar algum dia".

Um comentário:

  1. Oi, Elizabeth! 🌻
    Além das novelas televisivas, existe o gênero literário novela e também a noveleta, de 20 mil a 50 mil palavras e de 7500 a 20 mil palavras, respectivamente, que ficam entre o conto e o romance. Quando vi o tema dessa postagem na minha lista de leitura lembrei do gênero literário, um gênero que recentemente eu comecei a escrever.
    Gostei da postagem.
    Um abraço.
    ~Cartas da Gleize. 💌💕

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